Premiada várias vezes no Emmy, o Oscar da TV, no Globo de Ouro, entre outras láureas recebidas, The Handmaid’s Tale, ou O Conto de Aia, revelou-se uma das melhores séries dos últimos anos, de todos os tempos: pungente, contundente, infelizmente de acordo com o momento da humanidade e tendências intolerantes mundo afora.
Feita para o serviço de streaming Hulu – que ainda não chegou ao Brasil – mas visualmente cinematográfica e repleta de atuações magníficas. Elisabeth Moss dá vida à protagonista June/Offred e merecia todos os prêmios do universo.
Baseado no romance homônimo de 1985 escrito por Margaret Atwood e que rendeu um filme em 1990, o seriado escrito e produzido por Bruce Miller (Alphas, Eureka, Os 100) ficou melhor na segunda temporada.
Os EUA foram tomados por religiosos radicais. Somos apresentados ao futuro distópico onde a fertilidade diminuiu drasticamente. Algo mais ou menos como seria visto no excepcional Filhos da Esperança (2006), de Alfonso Cuarón. O temor em desaparecer do mapa faz a humanidade entrar em colapso. Quando o caos é instalado, o desespero faz seres humanos agarrarem-se naquilo que acham ser a salvação.
Na ficção, parte da população aceita o governo totalitário de radicais religiosos que transformam os EUA na totalitária Gilead, de classes sociais bem definidas. A “falta de fé” e os “pecados” teriam levado à falta de fertilidade. Mulheres que traíram seus maridos, gays e qualquer pessoa que seja considerada “profana” torna-se cidadã de segunda classe.
A vida real não está longe disso. Políticos tipo Jair Bolsonaro são enxergados, por parte da população, como a saída para por fim à corrupção. Levam ao público discursos de intolerância. Não são poucos os países nos quais mulheres, homossexuais, gente que não segue a religião vigente, são perseguidos, mortos, isolados, separados das famílias.
Cada episódio de The Handmaid’s Tale dói na carne, desgasta o espectador psicologicamente. Só não fica sensibilizado quem pensa igual aos governantes de Gilead. June foi isolada da filha, do marido. É estuprada dezenas de vezes. Faz o possível para sobreviver, não sucumbir. Sua trajetória é a de tantas mulheres.
Mas a série vai além. Esposas dos homens que comandam o novo país humilham outras mulheres. Os chefes, homens brancos de meia idade, usam o “dividir para conquistar” presente em inúmeros momentos da história da humanidade, sempre que alguém quer dominar o próximo: nas colonizações, na escravidão, na invasão da China pelo Japão, etc, etc.
The Handmaid’s Tale, o livro, foi escrito há mais de 30 anos. Continua atual. Não é sobre o futuro. É sobre o presente. E revela o quão vivemos em círculo. Quando achamos que evoluímos, que velhos preconceitos seriam superados, volta tudo de novo e em doses cavalares.
Ok, escrevi nada sobre a trama dos episódios. Posso dizer que conhecemos mais personagens e mais do universo de Gilead e situações além de suas fronteiras. O elenco segue irrepreensível e tecnicamente a obra é de um esmero só. Apesar do desgaste psicológico descrito anteriormente, há também admiração pelos artistas envolvidos, tanto talento reunido e o desejo, tanto na ficção como na realidade, de que as coisas melhorem.
O Conto de Aia
The Handmaid’s Tale.
EUA. 2017, 2018 – .
Criador: Bruce Miller.
Com Elisabeth Moss, Max Minghella, Yvonne Strahovski, Joseph Fiennes, Ann Dowd, Amanda Brugel, Madeline Brewer, Alexis Bledel.
Média de 60 minutos por episódio.