Enquanto escrevo a crítica, a classificação indicativa de Deadpool 2 no Brasil “baixou” de 18 para 16 anos. Nas próximas horas podem acontecer mudanças. Os defensores da moral e dos bons costumes estão vencendo.
Breve digressão: diariamente, em horário nobre, há violência, sexo, crime, etc, etc. Vivemos no país que aceita, nas novelas, reality shows, telejornais, pessoas matando, manipulando, prejudicando deliberadamente o próximo, mas surta quando duas mulheres ou dois homens se beijam nas telinhas ou telonas.
Deadpool 2 não tem, por exemplo, nada que De Volta ao Jogo (2014), estrelado por Keanu Reeves como John Wick, e Atômica (2017), com Charlize Theron, os longas anteriores do diretor David Leitch, não tivessem: violência gráfica ininterrupta e sexo. Ambos, no entanto, tinham recebido classificação 16 anos. Vai ver são sinais dos tempos, dos retrocessos, da hipocrisia quase geral.
Dois anos atrás, Deadpool chegava aos cinemas sem grandes pretensões. Orçado em US$ 50 milhões, pouco para os padrões dos filmes baseados em quadrinhos de super-heróis, arrebatou mais de US$ 700 milhões mundialmente.
Foi a vitória de Ryan Reynolds. Ele, tal qual Christopher Reeve e Superman, Hugh Jackman e Wolverine, Robert Downey Jr. e Homem de Ferro, tornou-se o próprio personagem. Foi o maior lucro da Fox, que detém os direitos dos personagens mutantes da editora Marvel Comics (até a recente compra do estúdio pela Disney).
O mercenário tagarela, como é conhecido pelos fãs, nunca foi do primeiro time nos gibis. Mas ganhou novos fãs. Virou pop. A continuação era bastante aguardada e entrega tudo o que o anterior possuía, em doses muito mais cavalares.
Após uma tragédia pessoal, Deadpool tenta se matar, entra em depressão, mas se redescobre ao identificar-se com um garoto de 14 anos, vítima de tortura numa clínica para mutantes. Sem encaixar-se nos X-Men, decide formar sua própria força-tarefa para libertar o adolescente. Pelo caminho, precisará enfrentar Cable (Josh Brolin), que vem do futuro para mudar o presente e salvar a esposa e a filha. Revelar mais estraga algumas surpresas nem tão surpreendentes assim para os leitores das HQs.
Na verdade, não há uma trama verdadeiramente dita. Tudo basicamente é desculpa para o protagonista destilar ironia, veneno e absurdos. O exercício de metalinguagem é mantido e expandido. Não há pausa. Lembram na escola da turma do fundão e dos mais quietinhos. A primeira atormentava os últimos. Deadpool é aquele colega que não se enquadrava em nenhuma panelinha e atormentava principalmente os bullers. Existe coração em meio aos caos.
Do elenco destacam-se, além de Reynolds, Zazie Beetz na pele de Domino, cujo superpoder é ter muita sorte, e Josh Brolin, que tem mais oportunidades ao encarnar Cable em relação Thanos de CGI de Vingadores: Guerra Infinita. A brasileira Morena Baccarin volta a viver a namorada Vanessa.
As referências passam pela Marvel, a DC, canções bregas, musicais, Exterminador do Futuro, histórias em quadrinhos e muito mais. Surgem participações especiais. Algumas são bem rápidas. E a cena pós-créditos é a melhor dos cinema baseado em heróis.
Obviamente não dá para levar uma criança de 8, 10, 12 anos. Mas proibir o filme para menores de 18 soa exagero. Até por que, vamos combinar, outro dia o primeiro longa passou em TV aberta. Por mais que surja um nu aqui ou ali, os palavrões corram soltos e exista uma cena de fazer jus à Scarface (aquele com Al Pacino), Deadpool 2 é, como diz o personagem, um “filme família”. Não a família perfeita ou pré-determinada. Mas a união de pessoas que se curtem, amam, completam.
Deadpool 2
Deadpool 2
EUA. 2018.
Direção: David Leitch.
Com Ryan Reynolds, Morena Baccarin, Zazie Beetz, Josh Brolin, T.J. Miller, Brianna Hildebrand, Karan Soni, Julian Dennison.
119 minutos.