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“Trabalhamos para os governados, não para os governantes”, diz um personagem em determinado momento de The Post: A Guerra Secreta, sobre o trabalho e a função da imprensa. Imprensa livre, mesmo que errante, essencial para qualquer democracia. Sem imprensa livre não há democracia.
Meryl Streep e Tom Hanks são os destaques. A atriz recordista de indicações ao Oscar interpreta Katharine Graham (1917-2001), proprietária do The Washington Post, jornal local da capital dos EUA prestes a lançar suas ações na Bolsa de Valores para se capitalizar e, consequentemente, ganhar fôlego financeiro. Pois é, nos anos 70 o jornalismo impresso já enfrentava dificuldades. Kat assumiu a empresa após as mortes do pai e do marido, então incumbido de comandar o diário. Não tem experiência no ramo. Vive nas altas rodas da cidade. E cercada por homens a “aconselhando” o que fazer. Hanks é Ben Bradlee (1921-2014), o lendário editor-chefe do veículo, 17 vezes vencedor do Pulitzer.
Quando o New York Times inicia uma série de matérias denunciando a atuação dos últimos governos do país na Guerra do Vietnã, com base em documentos sigilosos do Pentágono, o presidente Richard Nixon processa e impede o jornal de publicar mais reportagens do tema. A documentação acaba nas mãos da equipe de Bradlee. Ele precisa convencer Kat a publicar o dossiê visando a liberdade de imprensa.

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São personagens ricos, figuras importantes da história dos EUA. Principalmente, da história do jornalismo. Ben Bradlee, por exemplo, foi vivido por Jason Robards em Todos os Homens do Presidente (1976), o filme dos filmes sobre investigações jornalísticas: o caso Watergate, quando dois repórteres levaram o presidente Nixon à renúncia. Seu filho Ben Bradlee Jr. foi editor do The Boston Globe. Retratado no vencedor do Oscar, Spotlight: Segredos Revelados (2015), estava na equipe responsável por desmascarar os padres pedófilos da Igreja Católica.
The Post, Todos os Homens do Presidente e Spotlight e várias outras produções nos mostram como o jornalismo pode fazer a diferença, agir em prol da sociedade, dos governados, e não dos governantes. Pena que, atualmente, seja tão difícil encontrar editores, donos de veículos de imprensa, etc, idealistas, corajosos. A impressão que dá: não importa o lado, esquerda, direita, centro (para quem ainda denomina as coisas assim) estão recheados de fake news. Os interesses são outros. Não a população, a sociedade.

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Spielberg em poucos meses conseguiu a façanha de realizar – enquanto preparava Jogador Nº 1, programado para março – um filme inspirador, completamente de acordo com o momento do mundo, de governantes de todas as linhas políticas pensando em limitar a atuação da imprensa, de mulheres tentando encontrar seu espaço, a valorização, a igualdade de direitos, de respeito. Perfeito para a Era Trump. O diretor encara os fatos como aventura, as pessoas como heróis (e não seriam?), em situações intensificadas pela trilha sonora do mestre John Williams.
É uma história passada, nos EUA, com personagens de lá, não tão conhecidos aqui. Nada que um Google não ajude rapidinho. A dica é assisti-lo e, em seguida, emendar em Todos os Homens do Presidente. Historicamente, a trama do filme de 1976 começa exatamente onde a de The Post termina.
Para jornalistas, alunos de jornalismo, então, pode ser mais inspirador ainda e revelador que muita aula. E vamos combinar: qualquer elenco liderado por Meryl Streep e Tom Hanks, mesmo que não em suas melhores atuações, vale à pena. E tem Sarah Paulson (a grande atriz da televisão atualmente), Bruce Greenwood, Michael Stuhlbarg. Este último é pé quente. Na temporada de prêmios também está em A Forma da Água e Me Chame Pelo Seu Nome.
The Post: A Guerra Secreta
The Post
EUA. 2017.
Direção: Steven Spielberg.
Com Meryl Streep, Tom Hanks, Sarah Paulson, Bruce Greenwood, Michael Stuhlbarg, Bradley Whitford.
1h56min.